sábado, 15 de janeiro de 2011

Just another false alarm


Quando precisarem de explicar a qualquer indivíduo que não fale português, comecem por dizer que se trata de um quase inexplicável sentimento (isto vai facultar-vos uma ligeira margem de fracasso entre as limitações da vossa criatividade vocabular e a total ignorância dos que vos questionam perante o termo sem correspondente tradução). E prossigam:
Trata-se de um engenhoso desencontro incontrolável, um destoado destino tão pessoalmente arquitectado como agonizante é o desejo de o querer reverter. É uma ausência em nome de uma prioridade que se sobrepõe e corrompe a ingenuidade da expectativa. É um Nunca Mais que grita ao Para Sempre. Um silêncio esmagador no meio da mais turbulenta multidão. É andar na ansiedade do amanhã, num incipiente desenrasque diário, numa sincera espera pelo regresso despreocupado e sentido, pelo regresso perante todas as barreiras. Uma procura infrutífera num terreno saqueado, é o isolamento acompanhado. Um obstinado revirar dos despojos que se converte em sistemático e agudo desfecho contrário aos intentos marcados como indispensáveis no mais íntimo juízo das necessidades próprias. Sente-se um adiar da própria respiração que estrangula a vida quando ela tem de prosseguir. Um esbater contra os arranjos da vida, contra os projectos longínquos, contra a deslealdade dessas esperanças que embalaram e atraiçoaram o mais pragmático dos seres. Sensação, mais ou menos verdadeira, imaginária ou ampliada, de exclusão irreversível. Não conseguir atingir o estado de conformação com o irrecuperável e ansiar sondar-lhe o rasto. É sentir a dureza da distância com toda a fatal marginalização que ela comporta. É um aperceber constante de quão irreparáveis são os males advindos do sonho insustentável, da confiança desmesuradamente sustida, do encanto tão particularizado num desperdício de deslumbramentos sem retoma. É não querer mais nada e querê-la agora, apartando-se do restante que é apenas e somente isso; o resto. É uma miséria de arrastamento a que a alma se acostuma a saborear numa vã deslocação sem sair do mesmo ponto, de um desejo de pensamento simultâneo em silêncio e não acusado, por cobardia ou barreira intransponível.

Presumo que seja a isto que em português se atribui o termo “saudade”.

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