quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Ryan Adams - Desire


Num acordar demorado e descomprometido, ergueu-se hesitante nas horas e arrastou-se no pijama num pequeno-almoço sem pressas. O bocejo da satisfação matinal é interrompido pelos ecos da memória que tratam de tornear mais um dia de alusões íntimas e vãs. As janelas parecem hoje mais baças do que nunca como num incentivo gélido que confunde o impulso movido de necessidade certa com um racionamento de forças repleto de medo e cobardia. Mais uma repetida sucessão de imagens inscritas na mente reclamam num apelo ensurdecedor ao corpo para que vá à varanda.
Um arrepio e sente o banco de baloiço onde se senta sob o átrio e, ainda assim, protegido. Passaram-se meses desde que não se sentava no banco de baloiço…A manhã estava mais fria que nunca e pensava suficientemente corajoso sair à rua, chegando-se somente até ao átrio. Uma vez no átrio, depressa se fartou da compensação de sentir a lufada renovada nos pulmões e fitou a vedação amuralhada, a escassos metros, que lhe circunscrevia a propriedade. A passos largos viu-se já chegado ao muro, e procurou debruçar-se nesse limite que erguera no passado para sua segurança, fortificação que permaneceu inamovível no curso do tempo e que fixou a sua área de desempenho disponível.
Abraçado ao muro, conheceu a vastidão em volta em ainda em pijama, mirados os campos em redor, o rio por explorar, as árvores tornadas voluptuosas, a montanha por escalar, o aglomerado habitacional que despertara ali bem perto e, ainda em pijama, sacudiu as mangas já vencido pelo muro, baixou-se para arrancar umas poucas ervas em volta, apertou com afinco o cinto do robe e voltou para casa. O banco de baloiço continuaria a servir o propósito de que não se apercebera ainda. Entreter o tempo, confortar um espaço de inércia com a impressão de movimento. Esperança é a insistência em esperar, a condição teimosa dos que esperam. Esperam num fundo de equívoco bem engendrado e fechado, culpando terceiros por não invadirem a sua propriedade, essa propriedade jamais revelada.

sábado, 25 de dezembro de 2010

We're all faced throughout our lives with agonizing decisions, moral choices. Some are on a grand scale, most of these choices are on lesser points.

But we define ourselves by the choices we have made. We are, in fact, the sum total of our choices. Events unfold so unpredictably, so unfairly, Human happiness does not seem to be included in the design of creation.

It is only we, with our capacity to love that give meaning to the indifferent universe. And yet, most human beings seem to have the ability to keep trying and even try to find joy from simple things, like their family, their work, and from the hope that future generations might understand more.

Professor Levy
Crimes and Misdemeanors, Woody Allen



quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

na época mais "altruísta" do ano

Altruism does not mean mere kindness or generosity, but the sacrifice of the best among men to the worst, the sacrifice of virtues to flaws, of ability to incompetence, of progress to stagnation - and the subordinating of all life and of all values to the claims of anyone's suffering.The man who produces while others dispose of his product is a slave. The smallest minority on earth is the individual. Those who deny individual rights cannot claim to be defenders of minorities.

-I feel it. I don't go by my head, but by my heart. You might be good at logic, but you're heartless.

- Madame, when we'll see men dying of starvation around us, your heart won't be of any earthly use to save them. And I'm heartless enough to say that when you'll scream, "but I didn't know it", you will not be forgiven.

Ayn Rand, Atlas Shrugged, 385


segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

it's over


A mesma inquietação vem, repentina e fatal. Envolve com a mesma música até os membros ficarem dormentes. Agora sim, é impossível movê-los ao encontro ao trabalho interrompido. Enrola numa anestesia indesejada mas não recusada. Apodera-se da mente toda, a mente já cansada abala-se agora com o mais impenetrável pensamento. A ressentida lacuna afirma agora a vontade de vingar a não concretização dos desejos, da recompensa em falta. A lacuna desarticula o crânio numa implosão invisível e silenciosa que cobre todo o corpo e anula intentos durante minutos, horas ou dias. Durante o tempo que o espírito considera justo e suficiente para saciar a falta de compensação, sacrificar o bem-estar, oprimindo alguém com sobrecarga de constrangimentos inflexíveis com a recordação do que tem falhado, de quem lhe falhou, das falhas que o perseguem e não lhe perdoam. A desilusão perante os outros, o tédio de comunicar ou não ser comunicado caí-lhe sobre a alma na mais injusta das doses que não faz adormecer, nem esquecer num sono reparador longo o suficiente mas anula os movimentos, erradica o entusiasmo e gera um vício na auto-flagelação num atroz ciclo vicioso. Quem lhe chame preguiça, não entendeu nada do que atrás foi dito.


confusão

Uma tristeza de crepúsculo, feita de cansaços e de renúncias falsas, um tédio de sentir qualquer coisa, uma dor como de um soluço parado ou de uma verdade obtida. Desenrola-se-me na alma desatenta esta paisagem de abdicações – áleas de gestos abandonados, canteiros altos de sonhos nem sequer bem sonhados, inconsequências, como muros de buxo dividindo caminhos vazios, suposições, como velhos tanques sem repuxo vivo, tudo se emaranha e se visualiza pobre no desalinho triste das minhas sensações confusas.

Fernando Pessoa

Let Down - Radiohead



Let down and hanging around
Crushed like a bug in the ground
Let down and hanging around

Shell smashed, juices flowing
Wings twitch, legs are going
Don't get sentimental
It always ends up drivel

One day I'm going to grow wings
A chemical reaction
Hysterical and useless
Hysterical and ...

Pausas Violentas

O encerramento de etapas longas e duras, através de travagens bruscas e vitoriosas, são geralmente seguidas de pausas demoradas e plenamente gozadas não tanto com sentimento de realização inquestionável mas antes por uma súbita sensação de queda pessoal e inutilidade da energia empreendida nesse intervalo de tempo passado, em acções mecanicamente responsáveis desenvolvidas por meio de um entusiasmo agressivo ou da irracionalidade e perda de autonomia em meio de compromissos compressores.

Silenciado


Gere o silêncio, certifica-se de que o ganho em calar compensa. Sustenta a segurança falseada por um atalho de inacção. O valor das palavras, transfere-o para o plano da imaginação, criatividade vã e solitária. Descapitaliza a força das emoções, perde o ímpeto do que fica por mencionar. As palavras omitidas, transfere-as para a abstracção inútil e fechada que ele instrumentaliza para, por fim, tornar-se o instrumento do próprio medo da reacção externa. A reacção como efeito da interacção detida pela teimosia mental em ousar prever a reacção por sua vez detida

Amarrado na já vasta película de cenários na mente e auto-convencido pelo orgulho na sua racionalidade, raciona as palavras, esconde-as no domínio do inviável, fecha-as numa arca e sustem a fé na ausência de riscos. Conforta-se na sua convenção do aceitável, do recomendável e detêm-se de veredas onde alguém o aguarda encontrar. Criam vácuo de recíproca gestão de silêncios e perpetuam a aflição da pausa agitadora num rumo perceptível de desconforto em que o arrependimento se agudiza no eterno adiar.

Todos escondem o que alguém espera ouvir. Esperam todos o momento certo para acertar contas com o tempo mas são os momentos que marcam a traição dos que esperam. Ficam despojos do tempo e da luta assente em previsões desfavoráveis. Essa ficção, a percepção segura de uma reacção a evitar, engana-o com a força tal que lhe sussurra também a expectativa passada e arrastada de uma troca que ficou pendente em mútua abstinência e silenciada vontade.


Perdi os Meus Fantásticos Castelos

Perdi meus fantásticos castelos
Como névoa distante que se esfuma...
Quis vencer, quis lutar, quis defendê-los:
Quebrei as minhas lanças uma a uma!

Perdi minhas galeras entre os gelos
Que se afundaram sobre um mar de bruma...
- Tantos escolhos! Quem podia vê-los?
– Deitei-me ao mar e não salvei nenhuma!

Perdi a minha taça, o meu anel,
A minha cota de aço, o meu corcel,
Perdi meu elmo de ouro e pedrarias...

Sobem-me aos lábios súplicas estranhas...
Sobre o meu coração pesam montanhas...
Olho assombrada as minhas mãos vazias...

Florbela Espanca, in "A Mensageira das Violetas"

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

The Smiths - Is It Really So Strange




I left the south
I travelled north
I got confused - I killed a horse
I can't help the way I feel
Oh yes, you can punch me
And you can hurt me
And you can break my spine
But you won't change the way I feel
'Cause i love you

And is it really so strange ?
Oh, is it really so strange ?
Oh, is it really so, really so strange ?
I say no, you say yes
(but you will change your mind)

Why is the last mile the hardest mile ?
My throat was dry, with the sun in my eyes

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

now my heart is full

É como se fosses indiferente a uma deteminada embalagem de chocolates. Chega o dia em que provas o que está la dentro. Ficas "wuuoo nunca provei nada assim!" Vais à procura da embalagem e aquela imagem fica gravada na memória como algo que desejas consumir para toda a vida. Amas a embalagem porque sabes o que está lá dentro e passas a ter vontade de procurar a embalagem nas prateleiras do supermercado e ficas em extâse quando vês a cor, as letras, lá está ela! Não sao lindas as letras ?? E todos olham indignados para ti. Quase devoras sem abrir só de lembrar o que te aguarda.