quinta-feira, 26 de julho de 2012

Localism and Patriotism

Chesterton again highlights the connection between localism and patriotism. The geographical qualities that separate one group of people from another provide an isolation that encourages similar experiences. These common experiences foster the development of a common identity, leading to local loyalties and patriotism. The land that sustained the local people was naturally an object of affection and, having given life to the local population, it would be natural for them to defend it with their own lives. The lord of the land became a lord through his feats of arms in defending the locality. His hold on the loyalty to the local people was proportionate to how well he organized their defense in time of need. For the most part, the people remained loyal because through him they were able to defend and sustain their terrain.

In banding together and organizing the defense of the terrain that sustained them, the countrymen of the Middle Ages were setting down the foundations for society. After defense would come affirmation expressed through common worship and celebration. These two are tied together because of the intrinsic connection between the goodness of the created order and the thanksgiving given to the Creator. 

The celebrations that marked the rhythm of communal life found their cause in thanks giving to the Creator and commemoration of important dates in the history of the locality. Examples would be deliverance from an  invader through their own hard fighting and the intercession of a patron  saint, or the successful harvesting of a crop despite difficult weather conditions. The local religious bond was manifested in the form of parishes that provided the venue for both common worship and regular occasions for the people to meet and foster relationships. As the countryside became more settled and people began to perform more specialized functions, it was also natural to form various guilds that provided regulations of the trades and exchange of knowledge of the crafts. In this way, what began as a sharing of a common local terrain grew into a multi-faceted exchange of the most valued human interests; work, religion, and festivity. The deep attachment of these human goods together with an attachment to the local land that nourished them explained the closely defended love that goes by the name of patriotism.

Initiative-taking was a dominant characteristic of the medieval man who provided the foundation for this local self-government. The very origins  of the  noble families who comprised the local lordships came from those who took initiatives in feats of arms and organizing the local people into a system of vassals and loyal retainers. Perhaps this quality of planning was partially to rectify the lack of formal infrastructure in society that Chesterton alludes to when he speaks of the roadless Dark Ages. It certainly seems true that it was a time of building not only the structures of self-rule and religious life, but also the building of visible structures such as churches and halls that served as meeting places for communal activity and bore witness to the unity of the local people, if only because the cooperation of so many people was required to build them.

The Historical Imagination of G.K. Chesterton: Locality, Patriotism, and Nationalism
Joseph R. McCleary

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Aborto

Já a partir de Janeiro de 2013, todas as mulheres que quiserem usufruir do serviço público de interrupção voluntária da gravidez, para além de estarem isentas de taxas moderadoras (situação actual), terão ainda direito a talão de desconto em combustíveis e de descontos de 50% em higiene e na secção dos frescos. A cadeia de supermercados contava em incluir descontos no talho mas o director declarou em entrevista "felizmente as pessoas têm cada vez maior aversão a comer carne, tanto pelas preocupações com uma alimentação saudável como também pela repulsa em matar animais para satisfazer os egoísmos alimentares que as gerações nos inculcaram, por ignorância, ao longo dos anos". Num inquérito de viabilidade realizado via telefone, uma senhora comentou ainda: "O que vem mesmo a calhar para mim é essa dos combustíveis. Acho muito bem porque uma pessoa às vezes tem de se deslocar e nem sempre há um hospital à porta de casa, né' verdade? Os nossos governantes que ponham os olhos nisso que é de louvar...iniciativas dessas, venham mais!"



sexta-feira, 20 de julho de 2012

Televisão Pública: O Programa Que Ninguém Quer Ver



Conhecendo as despesas associadas à segurança social, saúde, educação e infraestruturas, poderíamos pensar: “porquê falar na televisão pública?”. Mas acreditamos que quando toca a depredação de recursos dos cidadãos, cada tostão merece atenção porque não é uma questão de gravidade consoante a quantidade mas sim de imoralidade em absoluto. Importa ainda mais se estamos perante a “vaca sagrada” da comunicação nacional que é um peso morto de prejuízo, um verdadeiro novelo interminável de prejuízo enrolado e embaraçado por actores políticos e grupos de interesse à sombra do Estado.

Passemos em vista alguns dos contributos da estimada televisão pública: debates inconclusivos, moderados por apresentadores enviesados e de mente tacanha, cujas intervenções são provas sistemáticas da fraca habilitação para comentar seja o que for; escamotear problemas regionais pintando um quadro incompleto e enfadonho nos programas matinais com mais oportunismo do que uma agência turística fraudulenta; desproblematizar casos de pequena e média criminalidade; falsear estabilidade política e omitir fracassos e escândalos que viriam confirmar a aptidão da democracia em favorecer e premiar os mais degenerados e corruptíveis. A lista seria longa.

Os acérrimos defensores da televisão estatal que confessem quanto tempo diário se expõem à educação e entretenimento que consideram imprescindível a esse público passivo e amorfo que tanto gostam de moldar e instruir. Que apontem onde está a especialização e a oferta que nenhum operador privado estaria disposto a oferecer. Apesar da debilidade de justificações em favor do serviço público, a efectiva privatização continua encalhada entre a influência dos operadores instalados que esperneiam e a resistência democrática que declara ser demasiado caro privatizar e reestruturar.

O público não é passivo como alguns legisladores gostariam que fosse – por curiosidade, recorde-se a recente manifestação do Bloco de Esquerda em Parlamento no sentido de proibir a exibição televisiva de espectáculos de tauromaquia – e privar o acesso ao que é definido como “mau”, “impróprio”, em favor da agenda promovida como “progressista”, “saudável”, “educativa” é cada vez mais uma tarefa impossível quando existe a soberania do zapping. Não só a escolha distribui-se agora por um leque alargado de 100 ou 200 canais temáticos, como também, é inegável a prevalência da internet como meio privilegiado da informação bidirecional, pois as pessoas não se sujeitam a perder tempo com interesses mal correspondidos e pouco apelativos. Aqueles que temem o comportamento de um ser humano com o comando na mão são os mesmos que ousam restringir as opções de um consumir, num supermercado, em dia de promoções. Se na série de ficção exibida pela RTP, “Conta-me Como Foi”, toda a família ficava, impávida e serena, exposta aos conteúdos que o Estado lhes apresentava, não julguem os legisladores que, em pleno século XXI, ficará alguém na sala, para além da avó.

Talvez os danos mais destrutivos não se fiquem pela factura que é apresentada todos os anos aos portugueses mas sim, a um maior alcance: algum isolamento nacional fica evidente quando a discussão de alternativas que são o “pão nosso de cada dia” em outros países, ainda são motivo de escândalo, silêncio ignorante e olhos arregalados no nosso país.
Não chega privatizar um, ou alguns canais. Não se trata de mudança meramente justificada por contenção orçamental (embora seja mais urgente do que nunca). Se a situação fosse de grande folga financeira já poderíamos aceitar a existência de rádio e televisão estatais que estão imunes à concorrência na captação de audiências e que contam com financiamento garantido à sua inviabilidade? Obviamente que não, como tal, defendemos a extinção por inteiro.

Há também aquele argumento de que se não fosse a RTP2 (canal de minorias, por definição), muitos programas culturalmente relevantes cairiam no esquecimento e não haveria oportunidade de os visionar. Parece um argumento fraco, pois quem tem muito interesse num determinado bem educativo, entretenimento ou informação, está disposto a um esforço adicional para aceder-lhe, ou adiar e até privar-se dele quando os meios pessoais não são suficientes (meios cada diversificados e acessíveis). Não existem almoços grátis…nem concertos, nem concursos, nem filantropia de pacotilha apresentada por apresentadoras generosamente remuneradas, nem filmes mudos às 2h da manhã. Tudo tem o seu preço e os portugueses estão a pagá-lo por meio das indemnizações compensatórias e da contribuição audiovisual cobrada na factura da EDP. Se algum de nós tiver um estábulo e quiser aproveitar ao máximo aquilo que paga pela electricidade, faz bem em deixar as vacas verem a Praça da Alegria. Em 2012, aponta-se agora para um gasto na ordem dos 508 milhões, suportado pelo Estado [1]. Acreditar em contenção é ignorar a natureza expansionista dos gastos públicos, pois em 2011: “Os gastos operacionais atingiram os 306,6 milhões de euros, crescendo 17,0 milhões de euros face a 2010”. A RTP acumula, por exemplo, responsabilidades que passam pelos “benefícios pós-emprego – reforma” e “plano de assistência médica – privados”, apoios que abrangem saídas voluntárias dos seus funcionários. Só em “férias e subsídios de férias foram gastos mais de 10 milhões e meio, no ano passado. Falamos numa média de 2.183 empregados [2] e de um salário médio anual que ronda os 40.000€ [3].

A viabilidade de produzirem conteúdos diferenciados é nula, embora no contrato de concessão da RTP esteja enunciada, entre outros itens, a obrigação de “combater a uniformização da oferta televisiva, através de programação efectivamente diversificada, alternativa, criativa e não determinada por objectivos comerciais”. O país dispensa a existência deste canal mesmo que interesses de outros operadores privados afirmem que não há espaço para mais canais comerciais; estes temem descobrir que afinal não são tão rentáveis e que afinal só subsistem através de chantagem e de barreiras ao avanço de rivais, potenciais captadores das cobiçadas receitas publicitárias. Se não há espaço para todos, alguém terá de sair “borda fora” e sairão invariavelmente os mais incapazes. Neste, como em todos os casos, a desconsideração pelo cidadão e a fraca qualidade do serviço acontece onde existe a subsidiação, directa da RTP e indirecta dos restantes canais. 

Os telespectadores preferem uma análise posterior ao relato dos factos e os canais públicos vêem-se também compelidos a acompanhar essa tendência. Esta forma de fundar uma opinião imediata e generalista sobre os assuntos é valorizada cada vez mais, para o bem e para o mal; pensar na fonte de reforço diário de poder que um canal público pode constituir, é razão suficiente para desejar a sua extinção.
Imparcialidade e independência não distinguem o serviço público, ao contrário do comumente afirmado em sua defesa. É preferível estarmos cientes de que a neutralidade não existe e o interesse dos accionistas vai ter sempre impacto na informação veiculada. Cabe a cada um escolher os conteúdos que terão sempre alguma subjectividade incluída mas ninguém pode forçar todos os cidadãos a pagarem a farsa imposta e consagrada na Constituição (nº5 do Artigo 38º). A experiência habituou-nos a intuir que quando uma oposição política levanta a voz para denunciar manipulação política dos meios de comunicação públicos, fá-lo somente por inconformismo face à desvantagem que depressa compensariam depois de uma eleição favorável.

Em suma, defendemos que a preservação de meios de comunicação tutelados pelo Estado é incompatível com um ambiente de difusão livre de informação em que cada indivíduo é responsável pelas suas escolhas de lazer, educação e informação; rejeitamos a delapidação de recursos com vista em alimentar uma máquina condicionadora de opiniões, de comportamentos e de ofertas culturais seleccionadas pelos intelectuais do estado para a “ralé”. E se nos questionarem sobre a coesão nacional? Bem, os laços identitários entre portugueses nasceram muito antes da fundação da Emissora Nacional em 1935 e nunca dependeram de estímulos engendrados por decisores políticos e de programas televisivos que ofendem a sanidade mental de qualquer um. Pelo contrário, a nacionalidade foi, muitas vezes, a força motriz da destituição de governos não consentidos e de projectos fúteis dos seus governantes, como é o caso da RTP.

[1]http://www.agenciafinanceira.iol.pt/media-e-comunicacoes/rtp-miguel-relvas-estado-relvas-ar-privatizacoes/1360644-5239.html
[2]http://ww1.rtp.pt/wportal/grupo/informacao_financeira/rc_anual.php
[3]http://economico.sapo.pt/noticias/salario-medio-na-rtp-supera-40-mil-euros-por-ano_127371.html


Ironic


An unborn baby today has more legal “protection” of his “right to die” than his “right to life.”
If an abortion is attempted and fails, the mother, for the infant after birth, can sue the doctor for “malpractice.” The crime: failure to kill the baby. The OB-GYN News recently reported how attorneys now can earn over a million dollars per year on suits like this “Cases involving…failed abortion have led to automatic settlements.”


The unborn child was a person when the “malpractice” occurred and under the equal protection clause deserves payment as an “injured” party, collectible at birth. If the newborn can collect damages from an “insult” (failure to be killed) incurred during gestation, this in itself confirms legal recognition that a person with legal rights truly did exist. The tragedy is that since the Supreme Court rulings of 1973 this legal recognition only occurs when life instead of death prevails. Why should this principle not be used to protect the life of the innocent victims? The law as it exists today says a fetus shall receive equal “protection” under the law while the law itself permits (and the government finances) his death. The fetus that deserves life—as all fetuses do—has no protection whatsoever. The law and the state thus become the enemies of life, not the protectors of life, just as they have become thieves when they confiscate property instead of protecting property by punishing theft and protecting rights of property ownership.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

desigualar

De todas as desigualdades existentes, a desigualdade desenhada pelo Estado é a inadmissível, pesada e ilegítima. Porque nesta os seus culpados são mais intencionais do que em qualquer outra. A sabedoria e sensatez conformam-se e adaptam-se às lotarias da natureza mas não podem tolerar as compensações e descompensações de força e capacidade impostas pela vontade da tirania, em especial da democrática.


quarta-feira, 4 de julho de 2012

O Legado do Poder Local em Risco?


Uma ideia frequentemente veiculada pela agenda política e entre a opinião pública é a de que existe, de facto, um excessivo peso da administração pública mas a raíz desse problema reside, em parte, na preservação de uma estrutura ultrapassada com numerosas unidades inúteis que devem ser racionalizadas segundo orientações centrais para, por fim, harmonizar o território e monitorizar potenciais abusos de corrupção local. Nestes termos, conceder autonomia efectiva e funções às instâncias inferiores seria promover a divisão num país já por si pequeno e que deve valorizar antes a unicidade interna.

Esta interpretação parece ver o problema do avesso e incorre na maximização das causas que proporemos aqui combater. O centralismo é a marca dominante que foi incutida ao modelo administrativo português e tem vindo a privar os indivíduos da capacidade de se comprometerem com a sua comunidade e de criarem hábitos de negociação em reciprocidade de benefícios que viabilizassem alternativas de mercado para suprir as necessidades particulares. As competências locais são niveladas por um mínimo denominador comum em prejuízo das economias locais e nos ganhos totais do país, e as transferências partem do mesmo "bolo" do Orçamento de Estado, com tendência a expansão despesista para gerir dimensão política. Conhecendo o despesismo incontrolado a nível nacional (com os mesmos incentivos e dificuldades adicionais de accountability) parece legítimo manter cepticismo quanto a limites, fixados por lei, para disciplinar despesismo local. O que não seria raro de encontrar proposto até por liberais que parecem accionar a ingenuidade quanto à natureza humana, no momento de travar os salteadores em momentos de asfixia orçamental. O nosso ponto central é que transferir funções para uma ordem superior, mais abrangente e distante, quando essas funções podem ser executadas e um nível mais básico de instâncias inferiores é uma deturpação do equilíbrio sustentado, no tempo e no espaço, numa dada comunidade de interajuda e confiança. Essa centralidade gera mais grupos capazes de desviar recursos para alimentar megalomanias públicas ou interesses pessoais e se isso acontece a nível local não há particular iniquidade nisto mas sim incentivos perniciosos centrais que alastram até às instâncias mais básicas.


As unidades administrativas que designamos, e repensamos hoje, como freguesias remontam a uma experiência histórica de séculos, fundada na necessidade de socialização e cooperação e incutida de valores agregadores de sinergias internas que foram inscritos na ordem territorial, muitas vezes com reflexos de rivalidades fronteiriças em defesa da própria comunidade. Tendo o seu processo embrionário entre a romanização, e a sua derivada componente cristã, as freguesias desenharam-se pela organização paroquial e em torno das primeiras manifestações religiosas peninsulares, tanto em aglomerados urbanos como em zonas predominantemente rurais. A titularidade de cidade, aquando da Reconquista Cristã e a definição territorial ao longo do século XIII e XIV, perseguiram a necessidade de delimitar as freguesias, numa realidade ainda imaculada de racionalizações e simplificações gerais, contudo, só no século XIX, já sob domínio do ideário republicano e laicista, as freguesias passaram a ser abrangidas na organização administrativa portuguesa.

Para uma detalhada e completa descrição da história das freguesias em Portugal, que não nos cabe aqui desenvolver, pode ser sugestiva a leitura de As Freguesias: História e Actualidade, de José António Santos, o qual citamos a propósito da importância das freguesias que extravasa, em larga medida, o domínio religioso: As paróquias ou freguesias têm a seu crédito o exercício de importantes funções locais atinentes ao quotidiano da vivência das comunidades respectivas. (...) Desde os primórdios, em colaboração nomeadamente com outras instituições da Igreja, inclusive as monacais, a sua acção está presente em múltiplos campos da área social, com relevância directa ou indirecta e em maior ou menor grau, nos concernentes a desempenhos de beneficência, instrução público, orfanatos, misericórdias e hospitais, actividades exercidas quase sempre em substituição ou em complemento do próprio Estado.


Como será de fácil ilacção, o desenvolvimento das freguesias não se deu ao acaso ou por decreto superior. Deu-se adjacente às condicionantes que levaram à permuta de serviços, emergência das actividades agrícolas possíveis, aproveitamento e partilha de certos bens e equipamentos. Estas interacções só eram possíveis perante a consciência da vantagem na colaboração e, tal como agora, parece um argumento frágil apontar que a reforma no sentido do fortalecimento e autonomia dos municípios envolveria mais despesa para o Estado numa altura de contenção. Se a administração central deixar de encerrar em si uma panóplia de competências passíveis de delegar aos municípios, deverá deixar de utilizar os respectivos recursos, já que esses ficariam afectos a quem ficar com as atribuições, sendo previsível também que as despesas acabem por descer, a longo prazo, graças à resolução menos complexa dos problemas, ao encurtar do tempo de resposta, à menor perda de sinais de mercado e ao refreamento da disfunção burocrática.

Depois do referendo de 1998, ignorado talvez pelo desadequado mapa das regiões proposto ou pela irrelevância na forma como foi problematizado e debatido, tentando homogeneizar o que não quer ser homogeneizado (pelo menos por imposição superior), permanecemos conformados perante a falta de desconcentração da gestão, perante a ausência de colaboração ligada por instâncias intermédias e perante o programático da nossa CRP que, formalmente, consagra a administração pública como sendo estruturada de modo a evitar burocratização, a aproximar serviços das populações e assegurando que os interessados participam na gestão. Enunciados sonantes não faltam e, para além da inconsequência destes enunciados que preconizam descentralização e subsidiariedade, a discussão fica desprovida de utilidade quando se centra essencialmente em números e reformas feitas em cima do joelho por pressão orçamental, em vez de centrar a atenção nas atribuições que permitiram colmatar desperdício de recursos e a participação efectiva e expressamente interessada.

Perante tudo isto e reconhecendo a necessidade de cortar nas despesas que a nossa administração pública encerra, a solução para este problema passa por dinamitar o foco que mais controla e mais consome e, por outro lado, impedir uma táctica de "terra queimada" promovida por Lisboa que tenta, a todo o custo, convencer o país de que os pecados são cometidos por autarcas e que urge afastar os recursos do egoísmo e irresponsabilidade das populações locais. Estamos conscientes de que a prevalência de um modelo centralizado e autista em Lisboa gera ainda mais distorções das capacidades regionais, (como pode ser observado globalmente pela conhecida transferência de riqueza do Norte excedentário e competitivo para a Lisboa, dominada pelo sector dos não transaccionáveis e acumuladora de défice). Devemos, numa concepção que privilegia o indivíduo e a continuidade das suas relações em comunidade, defender uma extensão progressiva das competências a nível municipal como centros de decisão facilitadores de negociação na provisão de ensino e formação profissional, transportes, favorecimento de uma política voluntária de ordenamento do território, laboral, colaboração com empreendimentos empresariais, e gestão mais responsável do património administrado pelas autoridades locais.

A capacidade do Estado central captar receitas, no quadro preferencial da descentralização fiscal, vê-se restringida pela acrescida vigilância dos indivíduos perante a expectativa de retorno pois estes estarão mais conscientes dos montantes tributados e da aplicação dos mesmos. Também controlarão melhor usurpadores da renda alheia, em defesa da propriedade, abster-se-ão de usurpar porque a punição social e a perda de prestígio social envolve um custo irreversível e absurdo, e ainda, verão facilitada a comunicação com os prestadores de serviços, favorecendo as alternativas mais vantajosas. Gostos, capacidades produtivas, diversidade cultural, características demográficas e aspirações diversificadas, insondáveis a qualquer planeamento central, definem procuras e ofertas muito específicas e a qualidade da resposta não se coaduna com critérios de equidade, solidariedade e desenvolvimento económico nivelados e impostos pela capital, especialmente quando Lisboa serve de altifalante à embaraçada argumentação estritamente político-partidária que revela pura resistência para conservar os cerca de 80% de funcionários concentrados na administração central.

Todos os interesses que deviam ser zelados por municípios estão à mercê de um ministro que reside em Lisboa, e que nem os conhece, nem devidamente os aprecia. Daqui resulta o predomínio da capital sobre as províncias, a pouca vida política destas, a sua anulação, e quase nenhuma acção sobre os negócios públicos; enfim, daqui vem a influência funesta de certos homens que, colocados pelo acaso, ou pelos cálculos da sua ambição, no foco onde se concentram todos os poderes, lançaram mão deles, e subjugam por este modo o reino, que pode, mas que já lhes não sabe resistir.

Alexandre Herculano – Opúsculos, Tomo I, Edição de Joel Serrão, Livraria Bertrand, 1983



Numa época de proximidade, imediatismo, trocas e deslocações encurtadas, valerá a pena repensar a proximidade dos municípios e freguesias, não como empecilhos retrógrados mas como células estratégicas em plena e prudente ligação com outras unidades. Só conscientes das capacidades endógenas e perto da agregação de interesses, como atenuante de alguns danos inerentes ao contexto democrático poderão ser viabilizadas alternativas de mercado que desviem o abusivo tentáculo do Estado. A diferença está em perceber que a solução, mesmo no recente Documento Verde, não pode partir de cima mas deve, isso sim, seguir uma coordenação territorial mais negociada entre as partes no local, na posse de informação valiosa e que não esqueça a importância do financiamento local como travão ao caciquismo. Quando a vontade de colaborar com outros grupos parte da base, assente nas próprias escolhas, reflecte a importância de laços familiares, redes de contactos profissionais, comunhão dos mesmos cultos, trocas comerciais e uma multiplicidade de outras relações civis que se cristalizaram num certo território. Partindo dessas escolhas autónomas é possível então explorar concertação horizontal e rede de parcerias voluntárias, na formação de capital social. Será crucial perseguir este ideal mesmo se o Estado central, amanhã, acenar com o lançamento do último "grito tecnológico" da versatilidade na captação de informação, prometendo um sistema de cálculo de outputs infalível e unificado que substitua os elos de proximidade. Simplesmente porque a experiência histórica não compactua com promessas paradoxais.
Publicado inicialmente no Movimento Libertário