quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Imigração ou Turismo?


Lamentável. Pobres aqueles que transportam na sua bagagem os sonhos de uma vida melhor nas terras lusas. O título é por si só uma grande ironia do destino.

Acabo de ler no ionline uma notícia publicada, no passado dia 6 de Agosto e, ainda assim, vem fresquinha. Os imigrantes que queiram sair de Portugal vão ter a partir de agora mais apoios do governo, através do Programa de Retorno Voluntário, cujo objectivo é ajudar os cidadãos de nacionalidade estrangeira a regressar ao país de origem ou a outro Estado disposto a recebê-lo.

Por falar em imigração. Curiosamente, dei por concluído (livrei-me definitivamente), no passado fim de semana, um pequeno trabalho de investigação com o qual tive irremediavelmente a obrigação de despender alguns dias espaçados no tempo, ou não fosse o meu tema uma aventura de curiosos, enfadonha e singular na sua irrelevância científica. Talvez o resultado final até tenha alguma qualidade que não seria expectável mas algo que não é feito com plena vontade e prazer é raro passar-me nas vistas em apreciação demorada. Verificação final de olhos fechados, empacotar e...longe da vista para toda a eternidade. Mas eu não queria vir explanar sobre as minhas frustrações académicas e sobre os documentos ostracizados que já se despediram da minha reciclagem numa qualquer purga recente.

O meu precioso trabalho tinha como tema: A Integração da Imigração Paquistanesa em Portugal. A náusea já não podia ser pequena, depois de teclar dezenas de vezes a palavra integração e outras semelhantes, depois de interiorizar, mastigar e arremessar com insistência ideias carregadinhas de multi-culturalismo prudente e lindo (como se gosta), de descomplicar tensões, orientar o meu discurso para a harmonia desejável entre sociedade civil e os novos imigrantes acolhidos e, (a cereja em cima do bolo), incutir ao Estado a responsabilidade de aproveitar este tímidos contributos académicos para conhecer a fundo a realidade que se predispõem a recolher entre seus limites nacionais limitados e assim conseguir pôr em curso políticas públicas adequadas. Não vale a pena frisar que, apesar da minha habilidade de "troca tintas" costumar ser até bastante generosa com os meus intentos, o meu trabalho final, desta vez, pouco tem a ver com a minha cara e acabou por fugir ao meu registo habitual, admito com tristeza.

E onde quero chegar com esta conversa? Bem, com certeza que já sentiram incerteza a meio de determinado trabalho teórico em que se apercebem que estão a escrever fluentemente grandes certezas sem ter o mínimo de confiança no que estão a afirmar. Acontece a todos, ás vezes até num simples post nos nossos blogues; escrevemos coisas de madrugada que nos parecem ilógicas e até vergonhosas na manhã seguinte porque até parece que a noite propicia o fundamentalismo e o nascer do sol revela o relativismo do nosso pensamento. E lá seguimos nós pelo dia fora a ocupar as horas seguintes, relembrando o que se amorteceu durante as horas de sono.
Estes casos sobre imigração favorecem este sentimento na cabeça de qualquer estudioso, principalmente a um estudioso que prefira dedicar-se a objectos mais concretos e com uma aplicação prática na realidade. Essa ideia de andar a tentar sistematizar a vida privada das pessoas não me convence e os fluxos migratórios não se limitam a traços mecânicos com motivações catalogáveis; é muito mais espontâneo do que isso e até, (desculpem se vos parece mal) muito mais bruto e instintivo. Vislumbro uma análise neste campo tão inútil que parece-me mais sensato deixá-la ao critério do senso comum, entre os horizontes apetecíveis e propícios à instalação no país de acolhimento e à mercê de reacções menos benévolas que tendem a surgir. Pois boa sorte, salve-se quem puder!

O caminho de regulação dos fluxos migratórios e da concessão de autorização de residência em função da questão do trabalho, por exemplo, levou a embaraços legislativos que levaram ao efeito contrário do planeado: mais burocratização dos processos, favorecendo a crescente entrada de estrangeiros pela via ilegal. Até para os mais altruístas benfeitores que legislam no nosso país, a tarefa de saber lidar com fenómenos destes e de haver ali uma inconsciência das possibilidades que se podem oferecer a quem chega e a quem fica, não se revela tão simples quanto isso. Com receio de ficar sobre-lotado, maquinando estratégias novas de escoamento ou por simples compaixão, aqui se demonstra o verdadeiro sentido do Estado. Uma medida que visa "incentivar o desenvolvimento dos países de origem dos imigrantes" Que forma airosa que os políticos encontram para dizer coisas desagradáveis como: vai mas é trabalhar para a tua terra!

O bilhete de avião e a atribuição de um subsídio para reintegração na nova comunidade, nos primeiros dias após a saída de Portugal são totalmente custeados pelo programa.
Só em 2009, saíram de Portugal 381 estrangeiros ao abrigo deste programa, tendo aumentado 9,8% em relação ao ano anterior, revelam os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

É por estas e por outras que uma pessoa como eu se sente apunhalada pelas costas ao pensar na idiotice que é sintetizar logicamente factos que ultrapassam o limite do imaginável e do razoável. Como deve ser lema num momento de pausa para férias, o melhor é não planear, deixar o tempo correr e logo se vê. Acho que em relação ao imigração deve ser essa a postura. Como não é suficientemente generoso acompanhar uma recepção condigna a estes recém-chegados, suportando muitos dos custos que a sua instalação comporta, vamos deixá-los usufruir por uns tempos do invejável potencial turístico de que Portugal dispõem e, mais tarde, oferecer a passagem de volta a casa, completamente à conta do dinheiro público. Isto sim é um incentivo ao fluxo de pessoas e ao multi-culturalismo.

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